Funções Aninhadas


Se você tem um Método coeso, que trabalha em apenas uma única tarefa, mas mesmo assim o código parece complicado, dificultando o entendimento e a manutenção… já pensou em refatorar o código utilizando Funções Aninhadas?

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Funções Aninhadas é algo que não existe em todas as linguagens. A linguagem Pascal tem e acho que devemos aproveitar essa feature.

Funções Aninhadas nada mais são do que funções declaradas dentro de outras funções ou Métodos.

Esse artigo irá mostrar os motivos e vantagens ao utilizarmos Funções Aninhadas, assim como algumas regras que devemos seguir ao utilizá-las.

Motivos

Funções Aninhadas é uma opção bem melhor do que pular linhas dentro da implementação de um Método com o intuito de separar blocos de código.

Cada função já define um bloco, com a vantagem de ser reutilizável em outra parte do Método.

Funções Aninhadas tem um conceito muito próximo da Programação Orientada a Objetos (leia esse artigo ). Um Método que contém Funções Aninhadas é como se fosse uma implementação de uma Classe Anônima. As variáveis locais serão como atributos e as Funções Aninhadas serão como Métodos privados.

Funções Aninhadas facilitam a correta utilização do WITH quando a implementação do Método é complexa ou quando o código utiliza composição com muitos Objetos. Dividir o código em pequenas funções, diminuirá as chances de haver conflitos entre identificadores que utilizam o WITH.

Resumindo: Funções Aninhadas deixam o código melhor organizado, fácil de ler e alterar.

Regras de Uso

Qualquer feature utilizada de forma indiscriminada poderá ser um potencial problema no futuro, ao invés de uma solução — o mesmo ocorre com o uso indiscriminado do WITH por programadores que não sabem exatamente o que estão fazendo.

Precisamos de regras e disciplina.

Abaixo algumas regras que você deve levar em conta.

Regra 1: Não utilize mais do que 3 Funções Aninhadas

É uma regra óbvia. Se você tem muitas Funções Aninhadas dentro e um único Método, é bem provável que ele esteja fazendo coisas demais. Pense na refatoração e decomposição em outros Métodos ou mesmo na criação de uma nova Classe.

Existem pouquíssimas exceções a essa regra.

Regra 2: Evite compartilhar as Variáveis Locais

Falei acima que um Método com Funções Aninhadas é como uma Classe Anônima, contendo Métodos privados e atributos. No entanto, sabemos que não são verdadeiras Classes.

É melhor que você isole cada Função Aninhada com suas próprias variáveis e argumentos, ou seja, evite compartilhar as variáveis locais do Método com as Funções Aninhadas.

Essa disciplina na codificação irá ajudá-lo na extração e refatoração das Funções Aninhadas, se for o caso, para criar outros Métodos com o mínimo de impacto possível.

Ao invés de utilizar a variável local do Método, passe a referência como argumento da função, mantendo-as isoladas.

Existem poucas exceções a esta regra. Por exemplo. Se todas as Funções Aninhadas trabalham sempre com os mesmos Objetos (variáveis locais) do Método, é mais fácil compartilhar as variáveis — ou refatorar criando uma nova Classe — do que ficar repassando-as às funções. Utilize o bom senso.

Regra 3: Apenas 1 Nível de Funções

Não complique. Use apenas um “nível” de Funções Aninhadas. Se você tiver utilizando mais de um nível, é provável que a função de “nível 2” deveria ser um Método.

Refatore.

Após a refatoração do código, o “nível 2” de Funções Aninhadas passaria a ser o “nível 1” no novo Método criado.

Sem exceções aqui!

Regra 4: Menos é Mais

Cada função deve implementar apenas uma única responsabilidade.

Essa é uma regra geral para codificar Métodos e Funções.

Sem exceções.

Exemplos

Funções Aninhadas podem ser utilizadas em qualquer tipo de Objeto.

Objetos que lidam com XML, por exemplo, onde é necessário trabalhar com recursividade e validações sempre são bons candidatos.

Mas meu uso pessoal de Funções Aninhadas é, na maioria das vezes, utilizada no código de Forms. O motivo é simples: É natural para o usuário clicar em apenas um botão e o sistema fazer inúmeras tarefas. Para o usuário é irrelevante se foi preciso 1 ou 20 Objetos para concluir a tarefa. O usuário acha que apenas uma tarefa foi executada quando, na verdade, inúmeros Objetos podem ter tido participação para executar o serviço.

Então, abaixo temos alguns exemplos do que eu considero um bom uso de Funções Aninhadas.

Observação: Podem haver erros de sintaxe, visto que eu estou escrevendo o código diretamente no editor do artigo sem compilar.

Exemplo 1: Pergunte, Faça o Serviço

Em alguns formulários temos que questionar o usuário sobre qual caminho o sistema deve tomar. Esses questionamentos, com mensagens strings, podem diminuir a legibilidade do código.

Somado isso com o uso errado do WITH, o código não fica elegante. Veja:

procedure TMainForm.DeleteButtonClick(Sender: TObject);
begin
  with TUserQuestion.New(
    Format(
      'Você tem %d registros para excluir.' + #13
      'Esse processo pode demorar.' + #13
      'Confirma a execução?', [
        DataSet.RecordCount
      ]
    )
  ) do
  begin
    Show;
    if Confirmed then
    begin
      ExecuteProcessOne;
      ExecuteProcessTwo;
      TUserInformation.New('Processo concluído.').Show;
    end;
  end;
end;

Nesse exemplo eu utilizei Classes de Mensagens ao usuário. Não precisamos de sua implementação para entender o que está ocorrendo aqui. No entanto o código pode parecer um pouco confuso para alguns programadores “não iniciados” no uso do WITH. Por exemplo. O Método Show após o primeiro begin, pertence ao Formulário ou a instância de TUserQuestion?

Também temos a mensagem em texto com quebra de linha e parâmetros concatenados. As vezes essas mensagens são maiores. O código fica uma bagunça.

Vamos refatorar esse código utilizando Funções Aninhadas:

procedure TMainForm.DeleteButtonClick(Sender: TObject);

  function Question(Total: Integer): IUserQuestion;
  begin
    Result :=
      TUserQuestion.New(
        Format(
          'Você tem %d registros para excluir.' + #13
          'Esse processo pode demorar.' + #13
          'Confirma a execução?', [
            Total
          ]
        )
      ).Show;
  end;

begin
  if Question(DataSet.RecordCount).Confirmed then
  begin
    ExecuteProcessOne;
    ExecuteProcessTwo;
    TUserInformation.New('Processo concluído.').Show;
  end;
end;

Mais simples?

Sim, optei por retirar o WITH, porque é mais simples dessa forma, nesse exemplo. Mas ele poderia ser utilizado caso o programador necessitasse de mais alguma informação da instância IUserQuestion, criada e retornada através da função Question.

Exemplo. Você pode fazer uma pergunta ao usuário onde ele deve digitar um valor. Nesse caso você precisa validar o retorno (Confirmed) e mostrar o valor digitado (Value):

with TUserInput.New('Digite o valor') do
begin
  if Confirmed then
    TUserInformation.New(
      'Valor digitado: ' + Value.AsString
    )
    .Show;
end;

Repare, também, que a função Question não tem mais dependência com o Objeto que vem do Formulário, DataSet.RecordCount. A função agora está isolada. Isso quer dizer que se você precisar dessa função em mais de um lugar, pode extraí-la, criar um novo Método e passar o argumento na sua chamada.

Exemplo 2: Clicou no “Botão Mágico” que Faz tudo

Imagine um Formulário que, ao clique de um botão, o sistema:

  1. Faz validações das informações desejadas
  2. Pergunta ao usuário se deve continuar
  3. Salva as informações no banco de dados
  4. Envia um e-mail notificando alguém

Claro que você terá uma Classe para cada uma dessas funções (certo?). Você não deve implementar tudo isso dentro de um evento num botão.

Por outro lado, a implementação mais correta seria separar essas ações em outras camadas, outras Classes, sem instanciar tais Classes específicas dentro do Formulário.

Infelizmente nem sempre temos tempo para fazer o 100% correto. Mas que tal fazer 80% correto para depois, quando tivermos mais tempo, refatorar com tranquilidade o código?

Aqui as Funções Aninhadas nos ajudam novamente:

procedure TMainForm.ConfirmButtonClick(Sender: TObject);

  function Checked: Boolean;
  begin
    Result := False;
    //if EmailEdit.Text <> '' then
    // Exit;
    //...
    Result := True;
  end;
  
  function Question: IUserQuestion;
  begin
    Result := 
      TUserQuestion.New('Confirma a operação?').Show;
  end;
  
  procedure Save;
  begin
    // persistência...
  end;
  
  procedure SendEmail;
  begin
    // envia um e-mail...
  end;

begin
  if Checked then
    if Question.Confirmed then
    begin
      Save;
      SendMail;
    end;
end;

Tenha em mente que isso é apenas um exemplo.

Todas as Funções Aninhadas devem seguir o bom senso e ter poucas linhas. Caso contrário, refatore.

Haverá muitas dependências entre o Formulário e todas essas Classes especialistas. Mas nem sempre precisamos abstrair em camadas. Pode ser um pequeno Formulário de um pequeno sistema, onde não haveria problemas em ter essas dependências.

Mesmo assim o código está limpo e elegante, com fácil manutenção.

Conclusão

Funções Aninhadas nos ajudam a codificar de forma mais simples e elegante.

É um dos caminhos para “seguir em frente” sem muitas preocupações com o purismo da Orientação a Objetos — devido a falta de tempo — mas sem deixar cair a qualidade do código no longo prazo.

Utilize-as com sabedoria.

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